Thursday, June 30, 2011

RAAM

O título deste post veio-me da leitura deste post no blog Recumbent Journal. É significativo, é emblemático, de algum modo é o reflexo do mundo em que vivemos hoje. São preocupações legítimas e observações pertinentes. Vale a pena ler.
A RAAM auto-qualifica-se como a prova mais dura do mundo em bicicleta - o Tour, o PBP, o Giro...? . É "aberta" a diversas classes, e permite a formação de equipas com diferentes numeros de atletas. Tal como noutras situações, compensa esta "abertura" com outros comportamentos a outros níveis, talvez um pouco menos desportivos, tal como aqui é relatado. E, tal e qual como o artigo se apresenta, levanta-se de novo a velha discussão entre os adeptos das recumbent e os adeptos das bicicletas tradicionais, mas levada a um nível diferente - e aqui sim, a fazer algum sentido. E passo a explicar o porquê, e a razão de incluir aqui este post.
Não faz - quanto a mim - qualquer sentido manter uma discussão sobre o que é melhor, as recumbent ou as diamond frame. Nada. Cada macaco no seu galho, e acaba sempre por ser uma questão de escolha (e gosto) de cada um - é como decidir acrescentar meio metro à bicicleta para aumentar a capacidade de carga atrás (Xtracycle) ou decidir usar um par de alforges a mais na roda da frente. É uma questão de gosto, de necessidade e de escolha. Não vale a pena dizer que uma recumbent é muito mais confortável e que tem uma eficiência aerodinâmica muito superior; muitas pessoas desistem à primeira subida, porque até ganhar o músculo certo a coisa não vai lá. Se a mudança de paradigma é difícil, a evangelização é perigosa. Eu sei porque é que gosto da minha bicicleta, e sei que há quem não goste, e depois? O mundo pára por causa disso? Nem pensar.
Já o caso da competição é diferente, e há aqui um ponto que tenho que salientar. Eventualmente a maioria das pessoas que vier a ler este post não o sabe, mas o mundo das recumbent tem sido um "caldo de cultura" fabuloso para o desenvolvimento das bicicletas, muito mais do que qualquer outro nicho, e por uma razão simples: não está tolhido por regras de organizações internacionais que espartilham brutalmente o alcance e a implementação de novas idéias e tecnologias. O céu é verdadeiramente o limite. O ciclismo de estrada segue à velocidade da UCI, e nas modalidades mais "radicais" segue-se o mesmo modelo, mais ou menos explícitamente, mais ou menos coniventemente à medida da capacidade e da disponibilidade dos fabricantes para imporem ou seguirem novos standards, mas sempre dentro do esquema dominante. Tenho que fazer um esclarecimento: quando falo de desenvolvimento não me estou a referir à utilização da fibra de carbono, do titânio ou de materiais compósitos, da utilização de suspensões integrais nem de componentes hidráulicos ou eléctricos; falo de uma alteração radical do modo como encaramos o que é uma bicicleta, refiro-me concretamente a bicicletas de tracção dianteira, bicicletas de direcção ao centro, streamliners, proned bikes, trikes, etc etc etc. -falo apenas de encarar a bicicleta a partir não da própria bicicleta, mas a partir do elemento humano que é simultaneamente condutor, motor e passageiro. É aqui que reside o busílis de termos regras que obrigam a que a roda pedaleira não possa estar mais do que x centímetros à frente do pneu dianteiro e que o total do conjunto não possa exceder um determinado comprimento, and so on. Estamos apenas a "fabricar" um produto que existe por si só sem contemplar a componente humana, necessária e indispensável para pôr a máquina a andar. É claro que se pode colmatar um bocado o problema, uns selins com um gel xpto, uns calções com uma espuma xpto, luvas com um bom apoio e por aí. Continua a ser uma escolha - isso ou sofrer mais ainda. Mas o elemento humano sai brutalmente prejudicado, e parece-me que há aqui a necessidade de definir um ponto de racionalidade: o conjunto é muito ineficiente e intrínsecamente potenciador de danos físicos ao atleta (incluindo a impotência sexual, facto pouco divulgado mas real, e é a este limite de "entrega" que se pede aos atletas que cheguem em prol do desempenho). A ineficiência mecânica do conjunto,  a competitividade exacerbada e procura da suplantação fazem do ciclismo uma das modalidades mais expostas ao doping - e isto deveria dar muito o que pensar a todos os responsáveis. Porque há muito dinheiro envolvido, porque há sempre muita gente com muito a perder, parece-me que principalmente por isso mesmo há muito pouca vontade de alterar o stus quo. E - voltando à vaca fria - é esse mesmo status quo que não quer ser alterado quando a equipa da RANS ganha a RAAM na categoria recumbent, sendo também a primeira classificada na geral. Mas a organização da RAAM apenas a indica a título oficial como a vencedora da categoria. Isto tem implicações efectivas nos patrocínios das equipas, na visibilidade das marcas (a RANS não se dedica em exclusivo às recumbents) e na visibilidade dos próprios nichos - imagino que a situação não fosse por aí além de diferente se a equipa vencedora fosse num tandem... E aqui sim, faz todo o sentido "defender" as recumbents: efectivamente provaram que são melhores, em igualdade de circunstâncias. É difícil defender em simultâneo que uma bicicleta que não consegue fazer uma subida (?) esteja a fazer batota porque tem uma aerodinâmica eficiente - como alguns elementos da organização fizeram. Este é o busílis da questão, não se trata de preferências pessoais, trata-se no limite da sobrevivência de um fabricante, da sua presença em competição, dos entraves que se lhe colocam gratuitamente à capacidade de angriar patrocínios. E negócios são negócios. E nos negócios não podemos fazer batota.
Não tenho nada a defender nem a atacar nas recumbent nem nas bicicletas tradicionais, se tiver que me meter pelo meio do mato seguramente não levo a compridona, mas se me meter a ir de bicicleta até Santiago de Compostela seguramente que vai ser com ela que irei. É uma questão de escolha. 


Para finalizar: todos os recordes absolutos de velocidade em bicicleta (não reconhecidos pela UCI) são reconhecidos pela IHPVA (International Human Powered Vehicle Association) e detidos por bicicletas "não convencionais". A constatação do que referi atás pode aferir-se numa simples comparação: a dos recordes de velocidade/hora da UCI, numa bicicleta "normal" (56,375 Kmts)  e da IHPVA, numa Varna Tempest (90,60 Kmts). De notar que o record da IHPVA supera a velocidade máxima ao sprint de uma bicicleta convencional. Mas é a média de uma hora. O record absoluto da IHPVA é de 132.50 Kmts/h numa Varna Diablo III.
Posto isto, a minha questão é a seguinte: deve o ciclismo de competição continuar anquilosado a regras arcaicas que são uma das causas primeiras da utilização do doping ou, pelo contrário, abrir-se a novas categorias, novos nichos e a uma alteração profunda do panorama ciclístico? Porque isto tem consequências práticas: se em 1934 a UCI não tivesse banido as recumbents das competições "oficiais" eu não teria escrito este post hoje, pelas razões mais do que óbvias -  sendo muito mais eficientes, acabariam por se ter tornado a escolha das equipas, e o ciclismo de competição hoje seria disputado em recumbents.

Wednesday, June 29, 2011

LWB

Ando (ainda) com um problema por resolver: a corrente "salta"... mas assim de uma maneira parva. Quero dizer, agora já não tanto, mas antes de ter feito alguns "updates", era assim mesmo. Saltava e "comia" uns quatro ou cinco dentes de seguida. E foi a tal ponto que ganhei medo de levantar o rabo do selim para pedalar, porque por duas vezes a coisa ia correndo mesmo muito mal - numa delas estive a um bocadinho de passar por cima do guiador, na segunda fiquei com uma negra na parte de dentro da coxa. Isto em dois dias seguidos.
Depois de andar à procura pela net, descobri que poderia eventualmente ser da corrente, que afinal de coisas estas coisas criam folgas... E eu a pensar que só as correntes das motas é que tinham esse problema, não me cabia na cabeça que o simples esforço da pedalada conseguisse "esticar" uma corrente. Mas a verdade é que estica, e não é pouco. A foto de baixo mostra apenas o que sobrou da corrente nova ao lado da velha, mas dá para ter uma idéia clara da diferença: em três ou quatro elos é visível a olho nú - a corrente de uma bicicleta normal tem umas dezenas largas de elos (cento e?). Pensei eu, grande besta que consegues dar cabo de uma corrente daquela maneira. Loucura. Depois de mudar a corrente, uma voltinha de teste. Ia deixando qualquer coisa agarrada ao quadro da bicicleta. Nada ainda. Decidi trocar o desviador traseiro dado que o que estava na bicicleta tinha uma folga fenomenal. Voltinha de teste, loucura total, assim que levanto os glúteos do selim, "crrrrrraaaaack" e já está. Mais um balde de fracasso. Decidi-me então por trocar a cassette, apesar de esta não ter sinais visíveis de desgaste. Foi quando me apercebi que a peça que suporta a cassette estava com uma folgazinha substancial... Pergunto-me se será natural...



Entretanto decidi-me por um teste à compridona cá de casa: trocar a roda 20" da frente por uma roda 26". Porquê? Bem, há uma série de razões válidas e plausíveis, mas acima de tudo foi porque me apeteceu. Ok, na realidade há umas quantas vantagens: uma roda maior é menos sensível ao estado do piso, permite um controlo da travagem mais preciso, e tendo as duas rodas da mesma medida só tenho que carregar uma câmara de ar sobresselente. Agarrei num garfo (com suspensão) que tinha de lado, uma roda da frente e um pneu geax 1,9" que guardo para situações destas, et voilà, ficou assim:



Creio que é perceptível nas fotos (principalmente nesta de cima) que a simples alteração do tamanho da roda conduziu a alterações significativas na geometria: o tubo superior do quadro já não está na horizontal, a inclinação do assento é mais pronunciada, bem assim como a da caixa da direcção, o que faz variar todos os parâmetros da geometria da direcção. Com que consequencias? Era o que queria determinar. Depois de algumas voltinhas curtas pela vizinhança, sinto que está mais estável, bastante mais confortável e com um comportamento em curva  de longe superior. A travagem também saiu largamente incrementada, e eu diria a medo que esta ligeira subida no eixo pedaleiro permite um acréscimo (tambem ele ligeiro) do torque na pedalada - pelo menos sinto a bicicleta algo mais leve, não sei exactamente descrever a sensação, mas a única conclusão razoável a que chego é essa, dado que a bicicleta não está nada mais leve.


Na foto de baixo uma alteração de que ainda não tinha falado: pintei a parte de trás do assento de vermelho-vivo e colei-lhe uma fita reflectora a toda a largura. Torna-se muito mais visível - e seguro - à noite.



Tenho uma forte sensação de que a roda 20" vai ficar de lado por algum tempo. Não é por mais nada, é mesmo porque a sensação com que fiquei é a de que esta bicicleta como que foi feita para ser uma dual 26" e não uma 20-26. Ainda assim, aquele trail exageradíssimo ainda há-de trazer algumas surpresas.

Monday, June 27, 2011

A caminho do Cabo Espichel

As fotos já são relativamente antigas, porque por razões diversas não tenho documentado as viagens que já fiz com esta bicicleta. Mas é verdade, o Cabo Espichel tem sido destino de eleição por uma série de razões - nomeadamente por valer a pena ir até lá a pedalar. Porque vale pelo caminho e não só pelo destino, o que é sempre positivo.
Estes passeios - os mais longos que tenho dado com esta bicicleta - têm sido muito bons. O único contra (principalmente em dias de muito calor, como ontem) é que a T-shirt fica invariavelmente ensopada nas costas, mas é mesmo o único contra. O facto de ser duríssima nas subidas mais íngremes (como o Frederico aqui comentou) é apenas um precalço, nem chega a ser um contratempo. Em subidas piores desmonto e empurro - e acreditem, o orgulho não sai ferido da experiência. Até porque tudo o resto mais do que compensa, desde o conforto (não tem nada a ver com qualquer outra bicicleta em que tenha andado) até à performance "média" - que é muito boa - apesar de o "motor" ainda estar enferrujado...
Já fiz cerca de 4 saídas com esta bicicleta, entre os trintas e os quarentas e poucos quilómetros cada, e cada vez mais me parece que as características que identifiquei originalmente se confirmam: o equilíbrio em baixas velocidades é complicado (cada vez menos, felizmente, à medida que vou "praticando" a gestão do centro de gravidade vai-se tornando mais simples), o que complica bastante as subidas mais íngremes que implicam sempre o recurso a mudanças baixas e a velocidades também elas mais baixas, dado que o "motor" ainda falha bastante... O conforto é seguramente o ponto a destacar, é absolutamente fora-de-série, e neste ponto esta incomparavelmente superior a qualquer outra bicicleta que já me tenha passado pelas mãos. A performance, com a tal excepção das subidas, é mesmo muito boa, acima de tudo por causa da aerodinâmica - a todos os amigos de duas rodas que ultrapassei ontem, não fiquem a pensar que sou um craque, na realidade a aerodinâmica é que faz a diferença - ainda mais com o vento que esteve. A manobrabilidade é muito aceitável, inclusivamente tenho feito algumas pequenas incursões fora de estrada em percursos simples, e o que hei-de dizer: não vai tão depressa, vai mais devagar, o que interessa é que vai na mesma. Vai indo, pronto.
Alguns pontos curiosos: a distribuição de peso. A distribuição de peso (f/t) não é nem 50/50 nem será seguramente 60/40; se for, andará na ordem dos 30/70 - e digo "andará" porque na realidade ainda não tive como medir este parâmetro. Mas conduz a comportamentos interessantes: a roda traseira é muito mais determinante no processo de travagem, principalmente em piso de terra, e a roda dianteira acaba por ter um comportamento que ainda não consigo descrever de todo. A roda dianteira bloqueia com alguma facilidade (comparativamente), obrigando a alguma atenção à repartição da carga na travagem, mas é muitíssimo controlável - não ganha "vida própria" tão facilmente como numa bicicleta normal.
De resto... ficam aqui as fotos. O objectivo é começar a fazer saídas cada vez maiores, à medida que as pernas forem dando para os quilómetros.